Antonio Padilla Filho
padillafilho@gmail.com
REA/Brasil
No dia 13 de junho de 2016 tive a oportunidade de observar pela primeira vez uma ocultação de estrela por um asteroide. O registro foi realizado na localidade de Corrêas, onde temos uma residência, na cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro.
Tendo em mãos a previsão com as circunstâncias do evento, me preparei com bastante antecedência para não haver imprevistos. Familiarizar-se com o campo estelar e testar com antecedência como o equipamento todo vai se comportar é de fundamental importância. Os eventos astronômicos 'com hora marcada' não combinam com improvisação ou falhas do equipamento. Nas ocultações que me preparei nos dois últimos anos, ou a meteorologia não colaborou ou houve falha de equipamento ou logística.
O registro de uma ocultação estelar asteroidal pode ser feito apenas visualmente mas a gravação em vídeo permite análise detalhada posterior para dirimir qualquer dúvida e eliminar um possível erro. Não temos como saber com antecedência qual será a duração da ocultação - ou mesmo se ocorrerá uma 'miss' (não-ocultação) - mesmo a estação estando situada dentro da faixa de visibilidade prevista. As predições são baseadas em probabilidade de ver uma ocultação ao longo da faixa de interesse. Portanto, o registro físico da ocultação em vídeo ou mesmo em fotografia (drift-scam) é o mais aconselhado para escapar das surpresas.
Usei um telescópio Maksutov SkyWatcher de 90mm de abertura com um redutor focal de 0,5x e uma câmera analógica Samsung SCB2000. A imagem gerada pela câmera foi exibida em um monitor de 14 polegadas, que foi filmado por uma câmera digital. Este não é o equipamento 'ideal' mas a vantagem é que os sinais horários podem ser gravados pela câmera , enquanto filma o monitor da TV. Ter acesso a uma fonte de hora certa é indispensável para saber com a melhor precisão possível o momento dos eventos e consequentemente a duração da ocultação.
Equipamento: Maksutov 90mm com montagem Virtuoso (motorizada) e buscadora, redutor focal 0,5x, câmera analógica Samsung SCB2000 (sem o filtro IR), câmera digital filmadora, TV analógica, notebook com o programa BeeperSync.
O vídeo obtido tem algumas deficiências, como os pixels mortos (deadpixels), mas a imagem da estrela é bastante clara e estável para se perceber logo após o sinal do minuto cheio (TL 22h31m00s) que há um breve desaparecimento, pouco inferior a um segundo, se levarmos em conta que o tubo de imagem da TV tem uma latência aproximada de 0,5 segundo quando a fonte luminosa desaparece.
As ocultações asteroidais
Ocultações asteroidais ocorrem com frequência mas não são tão fáceis de observar pois só são vistas de uma estreita faixa territorial, que tem a largura do asteroide. Com exceção dos asteroides maiores, geralmente esta faixa tem entre 80km a 130km de largura e a trajetória pode se estender por mais de um continente. Existem muito mais ocultações de estrelas mais fracas - lógico - do que mais brilhantes. Um observador fixo em sua estação, terá em média duas ocultações de estrelas de 10a. magnitude por ano. Portanto, a mobilidade é necessária se quiser ter mais chances de pegar uma ocultação.
Ocultação de TYC 7390-02379-1 (mag. 7.4) por 506 Marion em 27 de julho de 2016. A área de interesse para o observador se situa ao longo da trajetória e entre as duas linhas vermelhas (sigma-3). Ocultação bem favorável para Aracajú, Teresina, São Luís e também Belém e Salvador. Cortesia Derek Breit e Steve Preston.
A ocultação de uma estrela tem duas fases distintas: o desaparecimento e o reaparecimento. O observador deve registrar o momento exato em que elas ocorrem, utilizando o telescópio e uma fonte de hora certa. É de fundamental importância a precisão dos horários, com uma aproximação melhor que o décimo de segundo!
Uma observação bem sucedida tem utilidade para aferir a precisão das previsões - lembremos que todas as estrelas tem movimento próprio na Galáxia - e os catálogos precisam ser atualizados constantemente.
Se tivermos uma pequena rede de observadores espalhados transversalmente à trajetória da sombra do asteroide na Terra, teremos então diversas 'cordas' (linha de tempo entre o D e R), que refinarão o que sabemos sobre a forma do asteroide.
Mais de 50 observadores foram mobilizados para a ocultação da estrela LQ Aquarii pelo asteroide 90 Antiope, em 19 de julho de 2011. As linhas coloridas são as trajetórias onde se encontravam os observadores, que ajudaram a determinar os perfis deste asteroide duplo. Cortesia David Duhan/Iota.
Uma outra possibilidade, bem mais rara, é a descoberta de um possível satélite do asteroide. O primeiro reporte de evidência de um satélite asteroidal ocorreu em março de 1977, por ocasião da ocultação de gamma Ceti (mag. 3.6) pelo asteroide Hebe. Com um refrator de 12 cm de abertura, Paul Maley estava situado em Vitória (Texas), 1600km ao norte da trajetória prevista, e detectou uma queda de brilho de 0,5 segundo no momento em que a ocultação era observada da Cidade do México.
Hoje sabemos que inúmeros asteroides têm satélite e a primeira confirmação de fato ocorreu em 1993 quando a sonda Galileu descobriu Dactyl, orbitando o asteroide 243 Ida.
No ano de 2014 uma outra notável descoberta neste campo foi realizada pela equipe liderada pelo astrônomo brasileiro Felipe Braga Ribas. Durante uma ocultação estelar pelo asteroide centáurida 10199 Chariklo, duas estações de observação registraram pequenas quedas de brilho antes e depois da ocultação principal, evidenciando também que não só os planetas podem possuir anéis.
O registro das ocultações por observadores não-profissionais não tem muitos adeptos no nosso país. O campo é fértil para a produção de dados precisos se forem utilizados equipamentos adequados, que hoje estão ao alcance de qualquer pessoa que tenha interesse e o mínimo de recursos.
Links de interesse:
1) International Occultation Timing Association - IOTA
2) Liada - seção de ocultações
3) REA - seção de ocultações
4) Página de previsões de ocultações - Derek Breit e Steve Preston
5) Manual de ocultações (em inglês)
6) Página de Hristo Pavlov - BeeperSync e outros recursos
7) Occult Watcher – programa de ocultações asteroidais
8) Facebook - página de Ocultações Astronômicas